O ÔNUS DA PROVA NAS AÇÕES DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA

Por Leonardo Faria Schenk
23/02/2020

De um modo geral, a parte que faz a alegação de um determinado fato em juízo assume o ônus de comprová-lo. Ao autor compete a prova do fato constitutivo do seu direito. Já ao reu cabe a prova da existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.

Não se trata, contudo, de um modelo rígido.  Há muito, o sistema processual civil admite a inversão do ônus da prova ou a sua redistribuição conforme as peculiaridades do caso concreto relacionadas à impossibilidade ou à excessiva dificuldade de cumprir o encargo ou à maior facilidade de obtenção da prova do fato contrário (art. 373, CPC/2015).

Desde que não torne excessivamente difícil o exercício do direito – em especial do direito que decorre do contraditório, de participar do processo provando, com amplo acesso, pelas partes, a todos os meios de provas – a distribuição diversa do ônus da prova poderá ser deferida pelo juiz, em decisão fundamentada, ou convencionada pelas partes.

Tem sido comum o Ministério Público requerer a inversão do ônus da prova nas ações de improbidade administrativa. O quadro merece atenção.
Em oportunidade recente, em uma rumorosa ação de improbidade administrativa envolvendo dezenas de réus, ao acolher o requerimento do Ministério Público, o juiz recebeu a petição inicial e atribuiu aos réus o ônus de provar que não concorreram para os atos ilícitos que fundamentaram o pedido. Pela decisão, caberia aos réus, de forma ampla, a prova de que não aceitaram se submeter às exigências de pagamento de verbas ilícitas.

Há manifesta ilegalidade na inversão do ônus da prova em tais hipóteses. A natureza acusatória da pretensão impede a simples redistribuição do ônus da prova nas ações de improbidade administrativa. Ao Ministério Público incumbe a prova dos fatos constitutivos do direito alegado (STJ, REsp nº 1.393.587, publicação 16/11/2018).

Além disso, a ausência de imputação direta e objetiva das condutas na petição inicial das ações de improbidade – outro problema comum – conduz à absoluta impossibilidade, para o réu, de fazer prova de um fato negativo genérico. Essa prova seria diabólica, de impossível produção. E, como visto, por tornar excessivamente difícil o exercício do direito de defesa, a atribuição do seu ônus ao réu é vedada.

No exemplo citado, em boa hora o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro proveu o recurso de uma das empresas rés e devolveu a locomotiva para os trilhos: caberá ao Ministério Público a prova do ato improbo alegado e do suposto dano dele decorrente.